Enviado por Sandra Paulsen -
6.2.2009
cartas de estocolmo
Cronista “de araque”
Volta e meia leio, entre os comentários às “Cartas de Estocolmo”, perguntas do tipo:
* Mas, Sandra, você gosta ou não gosta da Suécia?
Ou então:
* A Suécia é assim tão perfeita mesmo ou é seu complexo de inferioridade que a faz escrever tão bem a respeito do País?
Ou, ainda, comentários como:
* Você está com saudades daqui, mas fica por aí mesmo porque a coisa aqui não está nada boa.
E volta e meia dá vontade de tecer comentários a esses comentários.
Em primeiro lugar, os que lêem as Cartas há tempos talvez já tenham entendido que eu nem gosto nem desgosto da Suécia. E que eu não escrevo para explicar por que razão gosto ou não gosto. Já havia escrito sobre esse assunto há algum tempo aqui.
Em segundo lugar, comecei a escrever, como Noblat contou em entrevista à CBN, a convite dele, que achou que poderia ser do interesse de seus leitores “viajar” na minha experiência de imigrante. Não tenho a intenção de convencer ninguém de que a vida aqui é melhor, ou pior, do que no Brasil. Acho esse tipo de julgamento sem sentido, já que, para mim, trata-se de fazer limonada com os limões que a vida me deu. Se, em vez de limões, a vida começar a me dar goiabas, tentarei fazer goiabada.
Em terceiro lugar, acho que deveria ser mais ou menos óbvio que, se vivo aqui, deve ser porque gosto daqui. E que, se sinto saudades, deve ser porque me faltam coisas que só o Brasil tem. Ou o Chile, para ser honesta.
A verdade é que ser imigrante, como bem sabem nossos avós libaneses, sírios, chineses, italianos, espanhóis, portugueses, africanos, alemães e japoneses, entre outros que fizeram o Brasil de hoje, é levar consigo para sempre uma saudade. Muitas vezes uma saudade do que não existe em nenhum outro lugar, senão em nossa mente.
O difícil de ser imigrante é que, muitas vezes, a gente não sabe a que lugar pertence. O esforço da adaptação é mal interpretado como traição à pátria. A resistência a flexibilizar aspectos da identidade é vista como ingratidão e desinteresse pelo país que nos acolheu. E a aceitação, a vontade de olhar as coisas de uma forma mais neutra e com menos juízos de valor, ou julgamento favorável ou desfavorável, também não é fácil de alcançar.
Ou seja, não há para onde correr.
E se você quer ser leal não apenas ao país que lhe deu tanto, mas também ao outro onde você aprendeu a ser adulto, ou ainda ao terceiro, que lhe deu oportunidades de fortalecimento do caráter e da fé... aí não há solução: não há como agradar a todos.
Por isso, peço a você, caro leitor, que ao ler estes textos, não tente encontrar mais do que um momento de distração, uma oportunidade para reflexão, um instante para “viajar”.
Se você conhece Juan Manoel Serrat, procure a letra da canção Juan y José, e entenderá em que penso a cada vez que me sento ao computador: que será que posso contar e que meu pai, minha mãe, meus irmãos, minha gente, enfim, acharão interessante? Como posso trazê-los aqui para perto de mim? Como posso compartilhar com eles a vida que levo?
Não procure razões inexistentes; intenções moralizadoras que eu não tenho; ganhos econômicos que eu não obtenho; interesses políticos ou comerciais que não fazem parte do meu menu de opções.
Eu escrevo tão livre de preconceitos quanto consigo ser, tão curiosa como sou, às vezes ingênua, outras, mais incisiva. Escrevo sobre o que atrai minha atenção. Não há pauta preestabelecida. Um dia escrevo sobre o que gosto. Outro dia, sobre o que detesto. Uma dor compartilhada é meia dor, uma alegria que a gente divide, paradoxalmente, fica muito maior.
Mas, no fundo, o que a gente quer mesmo é agradar e ser querida. Aliás, como boa romântica, acredito piamente nos Beatles: tudo o que a gente precisa é de amor!
Obrigada a você pela atenção e pelos comentários. E obrigada ao Noblat, pela oportunidade de virar “cronista”, ainda que “de araque”.
Sandra Paulsen, casada, mãe de dois filhos, é baiana de Itabuna. Fez mestrado em Economia na UnB. Morou em Santiago do Chile nos anos 90. Vive há quase uma década em Estocolmo, onde concluiu doutorado em Economia Ambiental.
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